Juíza mantém benefícios do Perse a empresa de agenciamento de atletas até 2027
Por: Mirielle Carvalho
Fonte: Jota Tributario
A juíza Simone de Fatima Diniz Bretas, da 34ª Vara Federal do Rio de Janeiro,
decidiu na última terça-feira (12/8) que uma empresa de agenciamento de
jogadores de futebol e contratos desportivos tem direito a usufruir do benefício
fiscal de alíquota zero de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins do Programa Emergencial
de Retomada do Setor de Eventos (Perse) até fevereiro de 2027. Esse período
respeita o prazo de 60 meses previsto na Lei 14.148/2021, que originalmente
instituiu o Perse.
A magistrada também afastou as limitações impostas pela Lei 14.859/2024, a
nova Lei do Perse, regulamentada pela Instrução Normativa 2.195/2024, da
Receita Federal, que impôs o teto de R$ 15 bilhões ao benefício, bem como a
exigência de habilitação prévia em plataforma eletrônica para usufruir dele.
A empresa sustentou que, por atuar com atividade diretamente relacionada a
eventos e entretenimento, vinha regularmente aplicando a alíquota zero dos
tributos federais abrangidos pelo programa. A contribuinte afirmou ter plena
expectativa de continuar usufruindo do benefício até o prazo final previsto, ou
seja, em fevereiro de 2027. Porém, observou que, em 22 de maio de 2024, foi
publicada a Lei 14.859/2024, que introduziu alterações significativas no Perse,
"que comprometem a estabilidade do benefício fiscal originalmente
concedido".
Tal instabilidade, segundo a contribuinte, criou "um cenário de insegurança
tributária, privando-a da previsibilidade necessária para gerir suas contas e
planejar suas atividades", sem saber se continuaria a usufruir do benefício fiscal
ou se seria subitamente obrigada a recolher tributos que não estavam previstos.
O argumento da insegurança tributária usado pela contribuinte não é algo
isolado. O Índice de Segurança Jurídica e Regulatória (Insejur), criado
pelo JOTA em parceria com professores do Insper para avaliar a percepção do
setor privado sobre a segurança jurídica e regulatória no Brasil, revelou que 87%
dos stakeholders de grandes empresas consideram que as leis mudam com
frequência no Brasil. Além disso, 65% dos respondentes afirmaram haver
contradições entre as diferentes legislações.
Limitar custo do Perse implica encerramento prematuro, diz juíza
Ao julgar o pedido, a magistrada avaliou que o limite de R$ 15 bilhões ao custo
fiscal do programa implica, na prática, a possibilidade de encerramento
prematuro do benefício, caso o teto seja atingido antes dos 60 meses
inicialmente previstos. Assim, considerou que a superveniência da Lei
14.859/2024, ao estabelecer limitações subjetivas e quantitativas, além de
introduzir condições novas, implica em revogação parcial do benefício em
violação direta ao artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN),
configurando-se "ato ilegal da autoridade coatora ao exigir o recolhimento dos
tributos com alíquotas restabelecidas".
Por essa razão, entendeu que permitir a revogação parcial ou total do Perse sem
observância aos limites constitucionais e infraconstitucionais atenta contra a
segurança jurídica e a proteção da confiança dos contribuintes. "O
ordenamento jurídico veda a atuação arbitrária e retroativa do Estado que venha
a frustrar legítimas expectativas jurídicas baseadas em normas vigentes",
pontuou a juíza. Segundo ela, a cláusula do Estado de Direito exige
"previsibilidade e estabilidade nas relações jurídicas, notadamente na seara
tributária".
Além disso, Bretas ressaltou que, ao prever a redução a zero das alíquotas dos
tributos federais pelo prazo de 60 meses, o artigo 4º da Lei 14.148/2021 — que
instituiu originalmente o benefício fiscal do Perse – configura, ainda que
tecnicamente se trate de "alíquota zero", uma hipótese de exoneração tributária
por prazo certo e mediante condições onerosas. "A distinção teórica entre
isenção e alíquota zero, embora relevante para a doutrina, não afasta o efeito
prático de exoneração plena e temporária, com característica de incentivo
setorial dirigido a um grupo de contribuintes previamente qualificado", explicou
a magistrada.
Logo, Bretas entendeu que o benefício instituído pela Lei 14.148/2021
caracteriza-se como isenção fiscal concedida por prazo certo e em função de
determinadas condições. Nesse sentido, a juíza destacou que a isenção em
questão não pode ser revogada ou modificada livremente, nos termos da
Súmula 544 do Supremo Tribunal Federal (STF).
A magistrada destacou ainda que a empresa comprovou documentalmente sua
habilitação ao Perse, assim como o cumprimento dos requisitos legais, inclusive
o enquadramento na Classificação Nacional de Atividades Econômicas
(CNAE) específica, o que confirma a legitimidade do seu direito a usufruir do
benefício até fevereiro de 2027, conforme fixado na própria que o instituiu.
"O perigo da demora decorre da possibilidade de inscrição em dívida ativa,
negativação em cadastros públicos e privados e imposição de sanções
administrativas e patrimoniais que impactariam a continuidade da atividade
empresarial da impetrante, gerando prejuízos irreversíveis", concluiu Bretas.
Guilherme Chambarelli, sócio do Chambarelli Advogados e responsável pela
defesa da empresa no caso, afirmou ao JOTA que a decisão "é um precedente
importante, que traz um alento e devolve um mínimo de segurança jurídica ao
setor de eventos em meio às seguidas mudanças que marcaram o Perse". Porém,
considerou que ainda é fundamental que haja uma pacificação da jurisprudência
nos Tribunais Regionais Federais, para que se garanta equilíbrio competitivo
entre as empresas, além de previsibilidade jurisdicional.
A sentença foi concedida no processo de número 5002027-22.2025.4.02.5101.
Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2).